quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Os animais e suas particularidades

Como mencionei antes, escrevi uma série de posts sobre o mesmo tema, e este (tomara) será o último sobre o assunto. Só pra resumir, até aqui eu apresentei alguns pontos: 

1- Ninguém lê os artigos publicados sobre as pesquisas feitas com animais. Pelo menos, ninguém que não trabalhe com o mesmo objeto científico ou com os mesmos "sujeitos".
2- Como encontrar um artigo científico desses, do modo mais fácil possível. Além disso, apontei para a falácia da existência de métodos alternativos na pesquisa com animais.
3- Mostrei como a parcialidade existente em alguns meios de comunicação é fruto de ignorância ou má fé. Sei que nada está livre de viés, mas o nível deste viés é preocupante.

Só pra adicionar uma coisa nestes pontos, eu não sou um especialista neste tipo de pesquisa (Os animais com os quais eu faço pesquisa são da espécie humana...). Então não sou um leitor assíduo dessa literatura, mas sim, sou cientificamente alfabetizado o bastante para pesquisar, ler e analisar a literatura. Tanto é que quando minha cachorra teve que passar por um procedimento cirúrgico, fui pesquisar os artigos científicos sobre o assunto. E me informei sobre todos os riscos e procedimentos necessários. Consegui me informar e isso fez muita diferença (graças às pesquisas com outros animais...)

Bom, pra finalizar este assunto de uma vez por todas, queria falar sobre ciência e especialmente a pesquisa experimental. Para tanto, entrei em contato com muitas fontes, blogs, vlogs, textos mais acadêmicos, textos de opinião, etc... E compilei isso em alguns pontos importantes. Algumas dessas fontes que achei mais interessantes foram as dos biólogos Yuri Grecco e Paulo Miranda. Então vou me pautar muito nos pontos que foram abordados nessas fontes. 
"Mas Fernando, estas são as fontes científicas que você tanto preza"? 
Não, mas são didáticas, e meu intuito neste post é ser didático. Se quiser ler meu texto sobre artigos científicos, vá para meu outro post.

Controle de Variáveis
Primeiramente, a pesquisa experimental trata principalmente de variáveis. Mas o que é isso? Então, uma variável é algo que pode ser medido, podendo ter limites (como por exemplo nossa idade, que vai de 0 a, possivelmente, por volta dos 90 anos...), ou não necessariamente (como a quantidade de habitantes em uma cidade). 

Muitas pesquisas se focam na medição de uma variável, como por exemplo uma pesquisa que pretende investigar o número de casos de câncer de próstata no mundo. Não existe uma relação entre variáveis nesta proposta, então não chamamos este tipo de experimental (tudo isso, superficialmente, ok?). Agora, em uma pesquisa experimental, o foco da pesquisa sempre é a relação entre variáveis (mais de uma, pelo menos), podendo ser uma relação causal ou não, mas essa é outra história. 

Então, por exemplo, se eu quiser investigar qual a relação entre violência entre crianças e o hábito de jogar jogos de vídeo game violentos, eu tenho que necessariamente, 1) identificar quais as variáveis de interesse e, principalmente, 2) encontrar um meio de medir essas variáveis. Então, nesse estudo imaginário eu decido que a variável violência entre crianças pode ser caracterizado pelo número de atos violentos físicos que uma criança tem com outra pessoa, e a outra variável, o número de horas que a mesma criança passa jogando jogos de vídeo-game violentos. Legal, depois de cortar as arestas, e arrumar tudo certinho, já tenho minhas variáveis e agora só preciso definir meu método de avaliação, de análise de dados, selecionar os participantes (e o numero de participantes), etc... (Sei que é um monte de coisa, mas as variáveis eu já tenho). 

Mas aí alguém pode dizer: E as outras variáveis que eu não estou olhando? E se a criança é espancada pelo pai e por isso é violenta? E se um dos participantes tem um diagnóstico de TDAH e toma medicamentos? E se... etc, etc, etc...  
E eu lhe responderia: Perfeito! É isso mesmo. Como controlar todas as variáveis estranhas? É quase sempre impossível, mas existem meios, usando testes, não incluindo crianças com diagnósticos, avaliando as práticas parentais, etc... E nesse tipo de pesquisa, com esse tema e nessa área (que seria talvez um foco da psicologia experimental), o efeito de algumas variáveis estranhas são contrapostas por replicações do mesmo estudo, aumento do numero da população, pesquisas transculturais, métodos de sujeito único, etc...

Mas e na área toxicológica??
E se eu quiser investigar a dose máxima de um analgésico por quilo,  por dia, sem que ocorram efeitos adversos danosos ao organismo? E se eu quiser estudar os efeitos de um novo procedimento na cura de tumores no cérebro?
Ai a coisa complica... Não posso me dar ao luxo de ignorar variáveis estranhas, não posso colocar em risco a vida e a saúde de seres humanos e depois fazer replicações e aumento da população estudada. 

Bom, então é só pela ganância e megalomania dos seres humanos que praticamos a tortura e a escravidão animal? Só por que não podemos colocar seres humanos em risco?

Não, sua anta (sem ofensa as antas). É justamente por conta da importância do controle de variáveis.
Se eu tenho uma linhagem de coelhos que eu conheço o genoma, que eu sei que não tem histórico de outras doenças, que eu cuido, trato, mantenho em ambiente controlado, limpo, climatizado, longe de predadores e, principalmente, conheço muito bem seu comportamento; essas possíveis variáveis estão todas estão sob controle! Simples assim. E é exatamente por isso que termos como tortura e escravidão são puro antropomorfismo (e burrice). Os animais estão lá por que estão lá... Não sofrem de depressão por suas escolhas de vida... Não sofrem pela falta da coelha amada... Não sofrem pela homofobia ou racismo... 
Ou seja, todas as variáveis que poderiam influenciar na pesquisa com humanos, na pesquisa com estes animais, estão controladas.

Por este motivo é que não é qualquer bicho que é usado em pesquisa. Muitos estudos preferem (quando se pode escolher) adotar animais que vivem pouco naturalmente, tem um desenvolvimento rápido, são muito bem conhecidos e sofrem com um menor número de variáveis estranhas, como o estresse... O que desmente comentários sobre o uso abusivo de cachorros e gatos em pesquisas. Além disso, a questão do controle de variáveis também demonstra que os cientistas não apenas se preocupam, mas devem se preocupar com o bem estar de suas cobaias, por que uma coisa mínima, como o jeito de pegar o bicho, pode causar dor ou estresse e influenciar nos dados da pesquisa.

Baseado no que já escrevi até aqui só queria comentar mais três aspectos criticados e que sempre pipocam da boca dos desinformados. Como:

"Por que não faz a pesquisa com criminosos, que estes sim deveriam sofrer, sabe, pedófilos, assassinos... E não os animais"
Puramente por conta do controle de variáveis. Se fossemos usar seres humanos como cobaias de estudos científicos de pesquisa básica, principalmente de cosméticos, toxicológicos, médicos, etc... Precisaríamos criar uma linhagem de seres humanos idênticos, com conhecimento geral de sua procedência, histórico de doenças, predições genéticas, etc, etc, etc... E isso não seria muito legal, mesmo por que seres humanos são muito "sentimentalóides", além do que, vivem muito e têm um desenvolvimento muito lento [modo ironia off].... Pessoas comuns como eu e você apresentam milhões de variáveis que não podem ser controladas neste tipo de pesquisa. Além disso, quem fala esse tipo de coisa, acha que pesquisa é tortura e morte, e que essas pessoas deveriam, portanto, sofrer e morrer... O que nos leva a outras discussões e possivelmente, psiquiatras...

"Porque não usam as alternativas que já existem. E sim, existem, porque todo ativista em defesa de animais sabe disso"
Bom, acho que já demonstrei como funciona uma dessas "alternativas" no meu segundo post. Mas só pra deixar claro. As alternativas que existem não substituem quase que nenhuma pesquisa com animais. Uma cultura de células é tanto um organismo, quanto uma jabuticabeira é uma cômoda... E uma simulação de computador é tanto um organismo quanto Tomb Raider é um manual de alpinismo.
Mas fiquem felizes, existem alternativas que diminuem o número de cobaias em cada estudo... E, pra mim, isso já é bem legal.

"Eu só uso produtos com o selo "Cruelty Free". Por que quero fazer a diferença..."
Ah, produtos livres de crueldade... hahaha. Bom, primeiro e menos importante: Associar crueldade com pesquisa é uma grande falácia... Mas, como eu já disse antes, se você acha que colocar um bichinho que provavelmente seria comido ou morto a vassouradas (em ambiente natural), em um espaço grande, climatizado, com comida, água, tratamento veterinário periódico, etc... É crueldade... Bom, é uma questão outra, que não quero discutir.
Mais importante é: Aquele produto que você compra pode até dizer que ELE não fez pesquisas com animais, mas este produto já foi testado por outra empresa (e sim, com animais) ou a empresa que gosta de vender o selinho do "CF" manda uma outra empresa fazer a pesquisa (e sim, novamente, com animais), com os devidos contratos de confidencialidade... Então me desculpem... Mas o "Cruelty Free" é tão valido pra mim quanto não comer no MacDonald's pra não fomentar o capitalismo...

Bom, é isso. Terminei minha série de posts sobre pesquisas com animais.
Quem quiser ler mais sobre o assunto, e especialmente sobre os cosméticos, recomendo este texto, é bem completo e interessante.

Abraço e até mais.  

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